30 dezembro 2005

Coroada de trevas

As mãos apertadas sobre o peito.
Os dentes cerrados sobre os lábios.
Os olhos vendados de medo e de insegurança.
E caminhei. Caminhei sem nunca olhar para trás.

As tuas feridas, meu amor, são as mais lindas. As que sangram o sangue mais vermelho e as que deixam as cicatrizes mais bonitas.
Quis eu ter feridas belas. Quis eu sofrer mais que o sofrimento. Quis eu mutilar-me aos poucos. Cada dia mais um pouco. Cada dia mais um dedo e mais um braço e mais uma perna e mais um pulso e mais uma-quaquer-coisa que doesse mais que essa outra grande ferida. Mas mais doem as feridas que me rasgaste que aquelas que me infligi.
E hoje... olha para mim, meu amor. Olha para mim. Tão feia que eu estou. Tão triste. Tão sem vida. Tão cansada. Tão... tão vazia. Tão sem nada. Uma coroa de trevas sobre a cabeça (sempre baixa) e um ramo de açucenas mortas na mão.
Ficaram-me as cicatrizes. E ficaram as tuas também...
Para nos sentarmos nas escadas de pedra nas tardes de primavera a contar a história de cada uma delas.
"E esta? Doeu muito? E esta? E aquela?"
E ir tocando levemente cada uma delas...
Um dia vais voltar a sentar-te com a cabeça sobre o meu colo e vou contar-te a estória da cicatriz do meu peito.
Aquela que sangrou mais que todas as outras.
Aquela que doeu mais que todas as outras.
Aquela que foi a mais bela de todas as outras.

Um dia, meu amor, vou contar-te como te amo.

Litostive

0 Comentários:

Enviar um comentário

Subscrever Enviar feedback [Atom]

<< Página inicial